Quem se interessa por cinema, mas não quer se limitar às produções comerciais ou prefere expandir seu horizonte fílmico para além das películas euro-norte-americanas, pode encontrar em No coração do mundo, de Denilson Lopes, uma ótima e diversificada leitura. Nos dez ensaios que compõem o volume, Denilson se preocupa em analisar o cinema através de uma estética do cotidiano e do comum, dando enfoque a cineastas como Tsai Ming Liang, Wong Kar-Wai, Béla Tarr e outros.
É interessante o olhar de Denilson sobre o comum num momento em que, em nossa sociedade midiática, de excesso de informação, ele tenha cada vez mais o desejo de falar [= aparecer], mas, em contrapartida, sinta-se cada vez menos ouvido. Hoje, feliz ou infelizmente, qualquer pessoa pode aparecer na mídia e, da noite para o dia, se tornar uma celebridade, mas isso não lhe garante voz [= conteúdo], apenas imagem [= exposição].
Para Denilson, é importante frisar, o homem comum não é antítese da celebridade, mas se aproxima de personagens excêntricos - na medida em que foi construído por Deleuze e Agamben, num diálogo entre o universal e o individual. "O comum é uma construção transversal que atravessa identidades, mas não as elimina, e talvez, no contexto global de hoje, atravesse culturas". Não se trata, portanto, de restringi-lo a um aspecto simplório, estigmatizado, excluído socialmente. O homem comum é sim um homem da metrópole, mas nem por isso (ou por isso mesmo) "visível".
Um aspecto interessante em torno do comum, na minha opinião, é que cada vez mais ele está "capturado" midiaticamente, isto é, dia a dia nossa sociedade imagética se interessa mais por pessoas comuns, que não teriam um status de importância que lhe outorgasse relevo. O interesse se daria justamente por ser comum, sem caracteres especiais. Seja no cinema, na literatura (notadamente nos blogs), na televisão (reality shows), o comum tem servido para saciar o desejo do público, que talvez se regozije em se reconhecer.
Paradoxalmente, este homem comum nutre a ambição de ascender socialmente justamente abandonando seu atrativo para se elevar à qualidade de celebridade. Denilson, "para traduzir esteticamente o comum, defend[e] que este pode ser pensado como uma encenação minimalista inserida num contexto pós-dramático".
No coração do mundo é um livro que reflete sobre o comum no cinema, mas as reflexões do autor podem e devem ser apropriadas para outras manifestações artísticas, pois, dentre outros motivos, são bastante atuais.
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