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quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Leitura "terapêutica" sobre Valente (por pura falta do que fazer)

Relacionar-se é bastante difícil. Independente de com quem seja, afinal, ceder, compreender, aceitar e respeitar podem ser verbos difíceis de serem conjugados para um sujeito egocêntrico. E mesmo para alguém capaz de abdicar do seu ego e altruisticamente dar mais do que receber, torna-se complexo qualquer tipo de relação cuja subjetividade acaba sendo a tônica. Sentimentos como amor, raiva, ciúme etc. muitas vezes complexificam a convivência entre duas ou mais pessoas. Mas talvez a relação mais complicada, porque primeira, é a relação entre pais e filhos. Que todo pai quer o melhor para o seu filho é dizer o óbvio, que ele buscará oferecer todas as oportunidades para o bem-estar e uma vida adulta saudável e bem-sucedida também é chover no molhado. Mas isso torna-se um problema quando o pai resolve achar que sabe o que é o "melhor" para o filho, anulando suas vontades e sua individualidade.
Assistindo a Valente, animação de Mark Andrews e Brenda Chapman, o zeloso pai pode se identificar com a rainha que educa a jovem princesa Merida de maneira a transformá-la numa irretocável rainha futura. Ignorando a aversão da filha pela vida monarca, que sua mãe traçara para ela, com insistência educa a princesa para aquilo que é o desejo não da princesa, mas de sua mãe. Talvez a rainha não tenha percebido que há dois tipos de filhos: os ideais e os reais. E é com estes que convivemos e com quem temos que nos relacionar. E respeitar. E apoiar.
Quando a jovem e rebelde Merida vê, a contragosto, sua mão disputada para um casamento arranjado, ela foge e se depara com uma bruxa. E então a situação se inverte. Ela solicita que a bruxa modifique sua mãe, de maneira a ser aceita como ela é - a antítese de uma princesa educada nos padrões reais. A falta de aceitação materna gera, na filha, a mesma inaceitação, que agora busca modificar a mãe. (Aqui poderíamos também dizer que é comum os filhos buscarem algo completamente diverso da motivação paterna como uma maneira de se autoafirmarem e contestarem a autoridade exercida pelos progenitores.) A bruxaria é feita, mas o resultado não foi o esperado. Em virtude do insucesso em modificar o outro - fato impossível -, ambas lutam para recuperarem suas identidades até então negligenciadas mutuamente.
Uma leitura mais terapêutica poderia ser desenvolvida, como o fato da rainha reproduzir a educação que recebera - continuaríamos agindo como nossos pais. É claro que, por se tratar de uma produção da Disney, o final é feliz, tudo se ajeita no fim, mas este é um filme que deve ser assistido com atenção pelos pais da criançada.
As crianças, por sua vez, poderão gostar do filme, mas não é o tipo de animação que entusiasmará os pequenos, pelo menos a julgar pelo público da sessão à qual eu assisti. Minha filha caçula, de quatro anos, mais de uma vez disse não estar gostando do filme e que estava com medo em várias cenas. A mais velha, de quase oito, não se queixou ao longo da animação e, no final, disse ter gostado bastante. Pode até não ser um filme excelente, mas aborda questões interessantes acerca da sempre conflituosa relação entre pais e filhos.

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